Por uma vez, em muito tempo, os portugueses não têm para onde olhar. Brasil, África e Europa pertencem ao passado. Com a particularidade de a Europa e o mundo terem deixado de ser fronteiras e horizontes a explorar e se terem transformado em ameaças e fontes de crise.
Por uma vez, em muito tempo, os portugueses têm de contar consigo, só podem mesmo contar consigo próprios. O que, numa sociedade livre e num mundo aberto, é muito mais difícil. Habituados e contar com expedientes e bodes expiatórios e mal educados pela demagogia política, os portugueses comprazem-se em aspirar a muito mais do que podem e têm direito. Consomem mais do que lhes é permitido pelos seus rendimentos. Querem mais do que lhes autoriza a sua produtividade. Devem muito mais do que ganham num ano. Adoptaram os tiques da cultura do êxito, dos vencedores, da gente bonita e da exibição de capa cor-de-rosa. E parece não se importarem com as enormes desigualdades sociais que fazem desta sociedade um pesadelo moral e estético.
A crise económica e social está instalada em Portugal. E bem instalada. Não há sinais de qualquer alívio a curto prazo. Ninguém espera uma melhoria efectiva antes de dois ou três anos. Algumas das causas desta situação vieram de fora. A começar pelos custos dos petróleos e da energia em geral, contra cujos aumentos nem sequer a Europa souber tomar providências a tempo. Mas Portugal já estava mal, muito mal, antes deste terceiro choque do petróleo. Há praticamente oito anos que Portugal vem perdendo, em termos absolutos e relativos. A verdade é que a “nossa” crise é em geral muito superior à dos parceiros europeus.
Quer isto dizer que somos os principais culpados. Desperdiçámos anos, recursos e oportunidades. Perdemos com a ditadura e a guerra. Perdemos com a revolução e a contra-revolução. Perdemos também com três décadas de facilidade e demagogia.
Assim chegámos ao ponto de perceber que ninguém virá em nosso socorro, que não há mais soluções fáceis e que, de fora, não virá mão redentora.
Só de nós próprios virá qualquer remédio. E isto não significa orgulho, nem raça. Muito menos talento ou história. Significa tão simplesmente estudo, persistência e organização. E, sobretudo, trabalho.
Fonte: António Barreto in Público de 1 Junho de 2008.